(minha reflexão sobre o propósito da vida)
Na semana passada enterrei mais um amigo - quinta feira 18/07 para ser mais preciso. Ultimamente minha vida tem sido assim: a de enterrar amigos. Quaisquer dias desses os que ainda restam me enterrarão... Fiquem atentos, pois não terei tempo para avisá-los. É tudo muito rápido...
Francisco Gonçalves já havia sido meu colega em 1976/77, quando trabalhamos na Transnatal. Nos últimos 13 anos, disputávamos a mesma clientela turística. Ele era um cara muito altivo. Porte de “lord”, andar todo “gingado” (ou elegante?) e de aparência de “importante”. Mas, era uma figura: fala mansa, sorriso controlado – bem diferente do meu, tão espalhafatoso -, sempre se pilheriando no seu jogo de carteado... E os colegas o chamavam de “Ministro”. Ele, a propósito, tinha o divertido habito de “matar” os conhecidos. Qualquer que lhe pedisse notícia de alguém, respondia com um: “Morreu! Enterraram e tudo”.
O corpo do colega foi depositado no chão do Cemitério Parque de Nova Descoberta. O ano passado eu fui lá três vezes: por Chico Macedo, Wellington de Carvalho e depois por Ademar Macedo. E, em todas, reclamei do abandono do lugar pelo poder público – e de familiares, que sob o argumento da “correria do dia-a-dia”, esquecem-se daqueles que dizem que amou - em manter decente a última morada de um ser humano. Excessos de folhas secas sobre túmulos, galhos de cajueiros, de mangueiras e outras arvores, também sobre os túmulos. Lixo em algum canto. Alguns jazigos abandonados, o mato cobrindo. E olhe que aquele cemitério guarda memórias de pessoas importantíssimas da História de Natal, da História do Rio Grande do Norte. Os governadores José Varela e Cortez Pereira, por exemplo, estão sepultados ali. Aliás, houve um tempo em que ser enterrado no Cemitério Parque de Nova Descoberta era “chique”. Mas, naquele momento eu refleti a diferença entre os cemitérios gerenciados pela prefeitura e os privados. Começa pelos funcionários. Gente com cara de quem está embriagada. Roupas coloridas em excesso, num momento de dor e luto. Um ou outro usa luvas, botas rasgadas na lateral. Sem falar que algumas das decisões, de última hora, saem de improviso: “Dotô, o sinhô qué que bote aqui uma laje”? E por aí vai... Também não há abrigo se chover, nem se fizer sol. Os enlutados ficam mesmo é no meio do tempo. Bem diferente dos cemitérios privados... Tudo administrado pelo poder público é infinitamente diferente do privado: cemitério, escolas, hospitais... Lembrei-me de Gabriel, o pensador: “Até quando você vai levando, porrada, porrada? Até quando? Até quando?”... Até Quando?!
Pode parecer estranho, mas, eu adoro visitar o cemitério. Só, na privada de casa e, no cemitério eu encontro o meu “eu”. Para mim, lugares ideais a uma reflexão da vida. Da minha vida... Quase que regularmente eu entro no cemitério do Alecrim. Geralmente “visito” Luiz Soares, Henrique Castriciano, Eloi de Souza, Major Coutinho e dona Adélia, padre João Maria (atualmente seu corpo repousa na Igreja de Nossa Senhora de Lourdes no Alto do Juruá, conhecido como Petrópolis), depois peregrino entre túmulos de gente que eu conheci, mas alguns não me conheciam. E rezo um “Pai Nosso” ali. Recito um “Salmo 23” acolá. Um “bate-papo”... Às vezes não quero ser contestado. E ninguém melhor que os animais e os defuntos para expressarmos o que pensamos... Eles nunca nos contestam. Creio que temos o péssimo habito de não querermos ser contrariados. Por fim, é a vez de visitar o túmulo dos Escoteiros do Alecrim. Local onde desejo ser enterrado. A propósito, em um dos meus aniversários escrevi: “Hoje, às 22h: 30m, completo 40 anos. Jamais pensei que pudesse ir tão longe, como também não penso em quanto tempo ainda vou viver. Mas, quando chegar o momento final, tenho como ultimo desejo ser enterrado no Cemitério de Arlington, o cemitério dos heróis. Ser trabalhador neste maldito país é ser, antes de tudo, um herói. Não sendo possível, que meus restos mortais sejam cremados e as cinzas jogadas no leito do Potengi, na altura da minha pequena Barcelona, para que se cumpra a escritura que diz: ‘do pó vieste. Ao pó voltarás’. Cidade do Natal, 10 de julho de 2001. Fcésar Barbosa”. O escritor lericê Duarte Cabral, me surpreendeu quando, em 2006, lançou seu livro “O Repouso Póstumo do Natalense no Cemitério do Alecrim”, e iniciou o primeiro capítulo com essa minha fúnebre reflexão.
Os preparativos para o enterro de Ministro continuavam, depois de uma torrencial chuva que caiu aquela manhã. Parecia lagrimas pelo trabalhador que partia. Aproveitei e sai vagando por entre túmulos desconhecidos. E até encontrei gente conhecida, e alguns, só de nome. Olhei suas “moradas” e pensei no quanto é “pesado” aquele lugar último. vi que é ali onde repousa um corpo morto, que em breve se decomporá e dará vida a milhares e milhões de vermes. É a vida morta dando nova vida... A natureza se refazendo... Mesmo saindo de um corpo sepultado com suas ilusões, vaidade, avareza, prepotência, mentiras, preconceitos, fantasias, taras, manias, hipocrisia, inveja, intolerância, valentia, soberba, intrigas, mesquinhez e, em suma, todas as aberrações da carne. Fica tudo ali. Guardados junto aquele corpo sem vida. Me Deus, são tantas as mazelas que acumulamos na alma, e que teimamos em não meditar sobre essas coisas, e continuamos a cultivá-las. E com muita precisão. Mas, o certo é que levamos algo, sim! E só levamos isso e nada mais: o amor que de alguém tivemos ou a alguém demos. Não confundamos com o amor carnal. Como a própria denominação diz, é carne. Falo do amor fraternal. Aquele que desenvolvemos para ajudar ao nosso próximo. Para tentarmos entender, compreender e nos aproximarmos dele. E o que é mais doloroso, e quase impossível, não é o amor desenvolvido para quem escolhemos ou gostamos. Não! No alto daquela montanha o Mestre de Nazaré foi absolutamente claro: “amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos persegue”, Eita danado! É aí o grande e significativo desafio. A “chave” que desata o “nó górdio”... Esse sim, o verdadeiro amor. O amor vivo. O amor da alma. Isso certamente levamos... - (fcb/cp)
Francisco Gonçalves já havia sido meu colega em 1976/77, quando trabalhamos na Transnatal. Nos últimos 13 anos, disputávamos a mesma clientela turística. Ele era um cara muito altivo. Porte de “lord”, andar todo “gingado” (ou elegante?) e de aparência de “importante”. Mas, era uma figura: fala mansa, sorriso controlado – bem diferente do meu, tão espalhafatoso -, sempre se pilheriando no seu jogo de carteado... E os colegas o chamavam de “Ministro”. Ele, a propósito, tinha o divertido habito de “matar” os conhecidos. Qualquer que lhe pedisse notícia de alguém, respondia com um: “Morreu! Enterraram e tudo”.
O corpo do colega foi depositado no chão do Cemitério Parque de Nova Descoberta. O ano passado eu fui lá três vezes: por Chico Macedo, Wellington de Carvalho e depois por Ademar Macedo. E, em todas, reclamei do abandono do lugar pelo poder público – e de familiares, que sob o argumento da “correria do dia-a-dia”, esquecem-se daqueles que dizem que amou - em manter decente a última morada de um ser humano. Excessos de folhas secas sobre túmulos, galhos de cajueiros, de mangueiras e outras arvores, também sobre os túmulos. Lixo em algum canto. Alguns jazigos abandonados, o mato cobrindo. E olhe que aquele cemitério guarda memórias de pessoas importantíssimas da História de Natal, da História do Rio Grande do Norte. Os governadores José Varela e Cortez Pereira, por exemplo, estão sepultados ali. Aliás, houve um tempo em que ser enterrado no Cemitério Parque de Nova Descoberta era “chique”. Mas, naquele momento eu refleti a diferença entre os cemitérios gerenciados pela prefeitura e os privados. Começa pelos funcionários. Gente com cara de quem está embriagada. Roupas coloridas em excesso, num momento de dor e luto. Um ou outro usa luvas, botas rasgadas na lateral. Sem falar que algumas das decisões, de última hora, saem de improviso: “Dotô, o sinhô qué que bote aqui uma laje”? E por aí vai... Também não há abrigo se chover, nem se fizer sol. Os enlutados ficam mesmo é no meio do tempo. Bem diferente dos cemitérios privados... Tudo administrado pelo poder público é infinitamente diferente do privado: cemitério, escolas, hospitais... Lembrei-me de Gabriel, o pensador: “Até quando você vai levando, porrada, porrada? Até quando? Até quando?”... Até Quando?!
Pode parecer estranho, mas, eu adoro visitar o cemitério. Só, na privada de casa e, no cemitério eu encontro o meu “eu”. Para mim, lugares ideais a uma reflexão da vida. Da minha vida... Quase que regularmente eu entro no cemitério do Alecrim. Geralmente “visito” Luiz Soares, Henrique Castriciano, Eloi de Souza, Major Coutinho e dona Adélia, padre João Maria (atualmente seu corpo repousa na Igreja de Nossa Senhora de Lourdes no Alto do Juruá, conhecido como Petrópolis), depois peregrino entre túmulos de gente que eu conheci, mas alguns não me conheciam. E rezo um “Pai Nosso” ali. Recito um “Salmo 23” acolá. Um “bate-papo”... Às vezes não quero ser contestado. E ninguém melhor que os animais e os defuntos para expressarmos o que pensamos... Eles nunca nos contestam. Creio que temos o péssimo habito de não querermos ser contrariados. Por fim, é a vez de visitar o túmulo dos Escoteiros do Alecrim. Local onde desejo ser enterrado. A propósito, em um dos meus aniversários escrevi: “Hoje, às 22h: 30m, completo 40 anos. Jamais pensei que pudesse ir tão longe, como também não penso em quanto tempo ainda vou viver. Mas, quando chegar o momento final, tenho como ultimo desejo ser enterrado no Cemitério de Arlington, o cemitério dos heróis. Ser trabalhador neste maldito país é ser, antes de tudo, um herói. Não sendo possível, que meus restos mortais sejam cremados e as cinzas jogadas no leito do Potengi, na altura da minha pequena Barcelona, para que se cumpra a escritura que diz: ‘do pó vieste. Ao pó voltarás’. Cidade do Natal, 10 de julho de 2001. Fcésar Barbosa”. O escritor lericê Duarte Cabral, me surpreendeu quando, em 2006, lançou seu livro “O Repouso Póstumo do Natalense no Cemitério do Alecrim”, e iniciou o primeiro capítulo com essa minha fúnebre reflexão.
Os preparativos para o enterro de Ministro continuavam, depois de uma torrencial chuva que caiu aquela manhã. Parecia lagrimas pelo trabalhador que partia. Aproveitei e sai vagando por entre túmulos desconhecidos. E até encontrei gente conhecida, e alguns, só de nome. Olhei suas “moradas” e pensei no quanto é “pesado” aquele lugar último. vi que é ali onde repousa um corpo morto, que em breve se decomporá e dará vida a milhares e milhões de vermes. É a vida morta dando nova vida... A natureza se refazendo... Mesmo saindo de um corpo sepultado com suas ilusões, vaidade, avareza, prepotência, mentiras, preconceitos, fantasias, taras, manias, hipocrisia, inveja, intolerância, valentia, soberba, intrigas, mesquinhez e, em suma, todas as aberrações da carne. Fica tudo ali. Guardados junto aquele corpo sem vida. Me Deus, são tantas as mazelas que acumulamos na alma, e que teimamos em não meditar sobre essas coisas, e continuamos a cultivá-las. E com muita precisão. Mas, o certo é que levamos algo, sim! E só levamos isso e nada mais: o amor que de alguém tivemos ou a alguém demos. Não confundamos com o amor carnal. Como a própria denominação diz, é carne. Falo do amor fraternal. Aquele que desenvolvemos para ajudar ao nosso próximo. Para tentarmos entender, compreender e nos aproximarmos dele. E o que é mais doloroso, e quase impossível, não é o amor desenvolvido para quem escolhemos ou gostamos. Não! No alto daquela montanha o Mestre de Nazaré foi absolutamente claro: “amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos persegue”, Eita danado! É aí o grande e significativo desafio. A “chave” que desata o “nó górdio”... Esse sim, o verdadeiro amor. O amor vivo. O amor da alma. Isso certamente levamos... - (fcb/cp)
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