Agora me dirijo aos amigos protestantes. Na tarde
de ontem encontrei um amigo, ali no Grande Ponto. Há anos não via aquele
senhor. Ele é evangélico da igreja Assembléia de Deus. Eu o conheci no começo
do ano de 1978. Naquele tempo Gilberto, outro amigo, me levava nos cultos de
sua igreja aos domingos. Acabei conhecendo muita gente. Dentre elas, o pastor
João Batista da Silva (1905-1999). Filho de uma família pobre que o queria
padre. Foi funcionário da Prefeitura Municipal de Natal. Em 1926 abraçou a fé
protestante. Em 1960 recebeu o chamado para
presidir as Assembléias de Deus no Estado do Rio Grande do Norte, depois de
servir na Bahia e na Paraíba. E dedicou-se até 1993. Ele foi tão importante na
evangelização que foi consagrado, por unanimidade entre as igrejas protestantes, como
"o Apóstolo do Nordeste". Aliás, em minha opinião, omitir
seu nome, e sua contribuição à história religiosa do Rio Grande do Norte, e de
parte do país, do livro “Natal 400 Nomes”, por ocasião dos 400 Anos da Fundação
da Cidade do Natal, foi um erro gravíssimo. Creio que o que de fato houve foi o
que podemos chamar de “intolerância religiosa” por parte dos organizadores do
livro. Ele era um homem negro, alto, às vezes risonho, às vezes muito sério.
Com uma vida toda dedicada ao evangelho, tinha uma zelosa dedicação ao
"rebanho". Todas as vezes que eu o vi estava sempre de terno, gravata
e um chapéu de massa, de cor cinza. Morava na Av. Presidente Sarmento (Avenida
4), Alecrim. Visitava suas "ovelhas", de Natal, ou das cidades do RN,
em uma veraneio da Chevrolet. Mesmo não sendo de sua fé, tive vários momentos
com aquele homem, ouvindo suas pregações, aconselhando os membros ou mesmo
dando carão, quando via algo que considerava errado. Lembro-me de um dia em que
proibiu um jovem do trompete ensaiar com o pessoal das guitarras. O trompete
era da banda de música. As guitarras, do Conjunto Vitória. Não deveriam
misturar os instrumentos... João Batista ouvia os membros em silêncio. Gostava
de apoiar as mãos acima da barriga, com os dedos entrelaçados, girando os
polegares no sentido de baixo para cima. Ao longe os “fofoqueiros” ficavam
prestando atenção se ele mudaria a rotação - de cima para baixo. Era sinal que
a confissão havia dado errada. Ele gostava de avivar a igreja dizendo:
"Que todo o povo diga amém!" A igreja se exaltava num só coro:
"AMÉM!!!" Sorrindo, ele completava: "'Alelóia'!" Uma noite
de domingo João Batista contou uma experiência de quando era menino. Morando
nos arredores de Ceará-Mirim, Seu pai havia lhe dado um saco com milho e a
tarefa de plantá-los em covas já preparadas. Acontece que ele queria brincar com
seus amiguinhos. A saída foi jogar punhados de grãos nas covas, ao invés de
cinco ou sei sementes. Seu pai estranhou ele voltar cedo do roçado. Quando
chegou o tempo da colheita, sua "malandragem" foi descoberta. O
milharal estava todo alterado, com espigas "aleijadas". O pastor contou
que seu pai foi com ele no campo semeado e lhe mostrou a anomalia da plantação.
Já em casa, o fez e se ajoelhar. O velho levantou uma chibata de "couro
cru" para golpeá-lo nas costas. Mas, ao invés de baixar o braço com violência,
desceu como em câmera lenta, encostando o látego em seu ombro com suavidade.
"Foi a maior surra que levei em toda a minha vida", dizia ele,
cobrindo o rosto com as mãos, carregando ainda - com mais de 70 anos - sua
vergonha. Lembrei ao amigo essa história, e falei do "culto
administrativo" (quando o pastor prestava contas a igreja - o que entrou e
o que saiu.), o amparo as viúvas, o Hospital Evangélico no Alecrim, e sua casa
aberta para os necessitados... O amigo riu com semblante triste, possivelmente
de saudade, e me disse: "Meu 'irmão', tudo isso morreu com o pastor João
Batista"... - chico potengy
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