segunda-feira, 2 de setembro de 2013

ESCOTEIRO ANDANTE: 90 ANOS DE UMA ÉPICA AVENTURA


Foto: Manoel Moura Filho

“Um escoteiro caminha com as próprias pernas”. Todo jovem que ingressa no escotismo – movimento educacional extraclasse criado pelo lord inglês Robert Stepherson Smyth Baden-Powell (1857-1941), em 1907 – conhece a frase, dita pelo jovem escoteiro Caio Martins. Nascido em Matozinhos, Minas Gerais, a 13 de julho de 1923, Caio Viana Martins faleceu em Barbacena, no mesmo Estado, a 20 de dezembro de 1938, depois de sofrer um grave acidente ferroviário, envolvendo dois trens, na madrugada do dia anterior. Quando lhe ofereceram ajuda em uma maca - e vendo a deficiência de transporte e a necessidade de socorrer outros companheiros feridos, dispensou a ajuda. Na recusa proferiu a célebre frase acima que o imortalizou.  Contudo, esse herói brasileiro só é conhecido por dar nome ao Estádio de futebol de Niterói, Rio de Janeiro, onde o Botafogo de Futebol e Regatas viveu tantas glórias. Curiosamente, sete meses antes de Caio Martins nascer, ou seja: no dia 14 de janeiro de 1923, cinco jovens norte-rio-grandenses partiram de Natal – mais precisamente do Grande Ponto - em direção ao Rio de Janeiro e São Paulo, a pé. Aqueles heróis foram os jovens José A. Pessoa, Humberto Lustosa da Câmara, Henrique D. Borges, Agnaldo Vasconcelos e Antônio G. da Silva. 

A jornada não foi nada “romântica”. Ao contrario: longa e sofrida; enfrentando índios, em Alagoas e Bahia (nesse último Estado se perderam e chegaram a caminhar em circulo), fome e sede. Finalmente os rapazes chegaram às margens da Baia de Guanabara. A travessia foi feita a nado e contou com o total apoio logístico da Marinha do Brasil - desde coletes salva-vidas, botes de acompanhamento e mergulhadores de prontidão em uma embarcação de combate naval.  Alcançaram o solo da “Cidade Maravilhosa” no dia 2 de agosto daquele ano. Foram recebidos como heróis. Em um banquete foram recepcionados por autoridades, maravilhados com aquela épica aventura. De lá os cinco rapazes seguiram para a próxima etapa a ser vencida: a cidade de São Paulo. Chegaram no dia 2 de setembro. Curiosidade: cerca de uns nove quilômetros antes do ponto de chegada, na terra paulistana, o povo foi para a beira da estrada saudar, e acompanhar, aqueles bravos jovens que passaram a História como “Escoteiros Andantes”. Indiscutivelmente é dos maiores feitos na história do país. Eu costumo dizer que se fosse um trajeto contrario, por sua importância histórica, era descrita em livros didáticos da História do Brasil.

De 1975 a 1981 tive o privilegio de visitar “Chefe Lustosa”, como era conhecido Humberto Lustosa da Câmara, em sua residência, ali na confluência das ruas Jean Mermoz, Ceará-Mirim, José de Alencar e Escoteiro Andante – e depois do seu falecimento a enorme casa, majestosamente erguida no alto daquelas quatro ruas, deu lugar a um imponente edifício residencial que exibe seu nome em letras douradas. Lustosa recebia seus visitantes escoteiros com um forte aperto de mão e sorriso acolhedor. Dava-nos orientações para que fossemos bons cidadãos, mas antes tinha o cuidado de botar sobre a mesa um grosso livro, com capa de madeira, onde havia o testemunho de autoridades de todos os municípios ao longo do trajeto de mais de três mil quilômetros. Carimbos dos correios, ou Estações de Trens, também faziam seu registro testemunhando a passagem dos jovens escoteiros. Quantas e quantas vezes escutei aquela história. O “mestre”, em alguns momentos, não continha a emoção. Mas, sempre chegava ao final de uma jornada épica jamais refeita.

Quem passa pela calçada do antigo Cine Rex, se prestar atenção, um pouquinho antes de chegar à esquina da Avenida Rio Branco com João Pessoa, existe uma pedra, cravada numa parede, segura por dois já desgastados parafusos, onde registra aquele feito heroico. E se em Natal tivesse políticos comprometido com a cidade e sua história, a Praça Kennedy, por exemplo, certamente se chamaria “Praça Escoteiro Andante”. Mas, não custa ter esperança de que um dia a Cidade dos Reis Magos vejam naqueles jovens aventureiros o exemplo de determinação, coragem, ousadia e uma meta a alcançar. - (fcb/cp)


Um comentário:

  1. Conheci Chefe Humberto Lustosa quando fui Escoteiro no Grupo de Escoteiros Almt. Ary Parreiras isso na década de 70. Mesmo com uma certa idade ainda fazia longas caminhadas e me lembro de uma delas sobre os trilhos do trem até um local chamado boágua ou barreira roxa (salvo engano), nas circunvizinhanças de Natal. Chefe Humberto era um gentleman, um homem educado, polido, simpático e muito sorridente. Adorava contar algumas piadas e rir das mais diversas situações. Passavámos muitas sorrindo lembrando das hilárias histórias do querido Chefe Humberto Lustosa. Um grande escoteiro, um grande homem, uma grande figura. Sempre Alerta !

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