sábado, 15 de setembro de 2012

GEOVÁ, O COSTUREIRO

(livre da hipocrisia: o fermento do fariseu)


Quem eu vi ontem na coloridíssima tela da TV Bandeirantes foi o estilista (ou o costureiro?) Geová Rodrigues. O rapaz levou um grupo de modelos, de nível internacional, para beber a água da cacimba onde ele bebia, nas margens do Potengi. Mandacaru, jegues, e outras riquezas da terra, formando o cenário para o seu mais novo lançamento de moda. E ele todo apoteótico, cheio de plumas e paetês. Pensei, será o mesmo tímido Geová que eu conheci ou voltou “atietado”? Perguntei-me lembrando de Tiêta quando volto a Mangue Seco.


Geová é da minha geração. E também fez parte do meu Grupo de Excluídos da Elite Barcelonenses. Naquela época todo “zé-ninguém”, todo “bundasuja”, todo “semfuturo”, todo “feladaputa” se achava no sagrado direito de gritar, em sua direção, alto e em bom som: “Viado”! “Fresco”! O pobrezinho, tadinho, tímido que só ele, baixava a cabeça com seus cabelos loiríssimos, uma carinha vermelha do sol abrasador da nossa terra e, com seu andar delicado, saia por aquelas estradas poeirentas rumo a “rodagem” – local onde passava aquilo que parecia o mais próximo da civilização. É..., “Barcelona” maltrata seus filhos desafortunados... Por essas e outras não sinto saudade de lá.

A história de Geová é curiosa. Em minha terra dizemos que quando Deus bota o olho em cima de um... Pois é, com este rapaz foi por aí o que aconteceu. Caçula de uma prole de mais de dez filhos, e de família classe media-baixa do lugar, tinha em sua mãe, uma das melhores costureiras da região. E reza a lenda que enquanto a genitora, envolta em linhas, agulhas, bicos e outros aviamentos, o garotinho brincava junto a seus pés, colhendo retalhos e costurando roupinhas de bonecas de pano – uma riqueza cultural que está sendo perdido por causa da norte-americana Barbie - ou coisa parecida. A meu ver, este foi o principal “catalisador” para a “mundiça” se achar no direito de desrespeitá-lo.

Certo dia Geová resolveu cuspir na cacimba onde bebia água e danou-se para as bandas de Natal, e de lá para o Sul do país. Terminou indo dar (sem trocadilhos maliciosos. O “Foi dar” aqui é apenas um “verbo” nordestino que quer dizer “foi parar em”...), vejam só, em Nova Yorque. Poderosa, não, o cão!

Sinceramente, eu nem me lembrava mais da sua existência. Antes de ele ir morar na terra de tio Sam(uel), me lembro que o encontrei em um ensolarado dia de praia em Ponta Negra. Creio que no começo de 1985. Eu havia indo mostrar a uma garota as belezas das pedras da deserta praia de Alagamar. Na volta, contornando o Morro do Careca, quem eu encontro? Geová! Lembro bem que sorrindo me perguntou: “Como vai Terezinha”? Depois conversamos animadamente sobre a temática “Barcelona” - nossa terra esquecida por Deus e pelos homens de boa vontade (sic). Despedimo-nos com ele me omitindo seus planos de ascensão. Nunca mais soube notícia e daí o meu esquecimento de que um dia existiu. Mas, há tantas outras pessoas eu também já esqueci! Amo quem me ama.

Em 2009, estava “veno” TV e és que Amaury JR. anuncia: “O maior estilista novaiorquino do momento é brasileiro e do Rio Grande do Norte, da cidade de Barcelona”. Eu gelei. Quem será esse “agraciado”, pelas cinco chagas? Aumentei o volume em 90 e me aparece todo sorridente: Geová Rodrigues. Quase cai da cama.

Com um sorriso encantadoramente brilhoso mandou beijos e abraços a toda comunidade “internacional” barcelonense: Riacho Fundo, formigueiro, Guanabara, Boqueirão, Cotovelo, Caiçara dos Barbosa, Caldeirão, Pena Fiel e Lagoa Seca. Não esqueceu ninguém o gentil e sorridente rapazinho de agora quarenta e poucos anos, creio eu. Confessou a Amaury que havia encontrado o luxo no lixo. E “inté” aquelas magricelas mulheres das bandas de Hollywood andam desfilando dentro de um vestidos saídos de suas mãos abençoadas.

Comentei com “Dona Graça”:

- Olha aí, minha “filha”, conheço bem a história desse rapaz. Ele merece o sucesso que o mundo está lhe dando. Pelo que vi, perdoou seus antigos desafetos. Este é a sua vitória maior.

Enquanto isso, “Barcelona” delirou. Todo mundo virou “amigo”, todo mundo é seu conhecido, Comunidade no Orkut em sua homenagem, blogs alardeando seus feitos, jornais da capital destrinchando sua história de trás para frente. Colunistas sociais contando tudo tim por tim e ainda entrando em detalhes. Da noite para o dia aquele ex-excluido se tornou a figura mais importante, o filho mais ilustre nascido na terra do “doido de Roque”. Tudo virou festa. Ô maravilha. O sucesso é muito ótimo de bom... Mas os festejo, para mim, soam mais falso do que gemido de rapariga.

Meu recado: Geová, sem hipocrisia (não precisamos disso, não é?), aqui de dento da minha rede, comprada - e paga - em Jardim de Piranhas, eu lhe parabenizo e lhe desejo todo o sucesso do mundo. Seu sucesso é seu e de todos “nóis” excluídos barcelonenses.

E graças a Deus, na “doce” Salgado, “viado” não passa de uma palavra homofóbica para ser usada somente naqueles a quem a sorte não lhe sorriu. E Geová Rodrigues? Bom, agora não é mais “fresco”, e se não é HOMEM, pelo menos é GENTE!

(fcb/cp)

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